Do Luto à Luta.



Fotografia realizada em 31 de janeiro de 2012, na minha primeira visita ao Museu Nacional.

Não era dessa forma que eu gostaria de começar esse projeto. Porém, nem sempre temos controle das circunstâncias que nos atingem. É muito difícil trabalhar com Educação, Cultura, Pesquisa e Ciência no Brasil. O incêndio no Museu Nacional é um símbolo dessa dificuldade. Acompanhei pela internet as chamas consumirem nosso maior patrimônio, a História. Mas a dor já era sentida há muito mais tempo. O fogo do descaso das autoridades públicas com a Cultura, Educação e Ciência neste país já nos consome desde muito tempo. Quando vislumbramos alguns avanços, eis que nos queimam mais um sopro de esperança colocando um Teto em áreas que são vistas como gastos e não como investimentos (PEC 241 que congela em 20 anos “gastos” com Educação e Saúde).
Diante do meu computador eu vi as chamas consumirem o Museu Nacional. Vi minuto a minuto parte de mim (e de todos nós) indo embora, virando cinzas. A tristeza me abateu. Parece que eu perdi alguém muito querido. A dor tomou conta de mim. Chorei até soluçar. Na madrugada não consegui dormir, a cabeça estava a mil. Pensei: “como deixamos isso acontecer?”, “O que podia ter sido feito?”, “O que eu poderia ter feito?”. Lembrei de imediato do meu projeto em retornar àquele museu para fazer novos registros, para produzir conteúdo para este blog. A vida corrida de professora/estudante não permitiu. E lamentei.
Na madrugada do incêndio, em meio as postagens na timeline do meu Facebook vi as notícias de que tudo tinha sido perdido. Não sobrou nada. Vi a dor dos meus queridos colegas de História e de Rural em seus lamentos e questionamentos. Vi a dor dos meus colegas de profissão. Vi a dor dos trabalhadores do Museu que entraram no meio do fogo para salvar alguma coisa. Vi a dor dos bombeiros que não tinham condições de fazer muita coisa. Vi a dor dos frequentadores, dos moradores do bairro de São Cristóvão. Vi a dor dos meus alunos, que enviaram mensagens de incredulidade pelo que estava acontecendo e também de apoio.
Em meio a tantas dores, vi uma postagem sobre Escravidão que não continha qualquer apuração acadêmica em seu conteúdo, sem referência, sem qualquer indicação de autoria, com o único objetivo de desmoralizar o Movimento Negro. Vi outra acusando Mandela de ser um comunista sanguinário e assassino com fontes de sites de extremistas brancos norte-americanos, um terreno perfeito e muito fértil para fortalecimento do racismo, xenofobia e neonazismo. Postagens como essas têm invadido as redes sociais e contribuído ainda mais para a contínua desvalorização da pesquisa neste país. O famoso “se tá na internet é verdade” provocado pelas fake news acaba colocando em xeque nossa ética, a seriedade do trabalho do pesquisador, pois são sempre pautadas em afirmações absurdas e são utilizadas para desacreditar o trabalho de anos. Acredita-se que com uma imagem ANOS de estudos, leituras e reflexões podem ser questionados pois o indivíduo viu na internet e tomou para si como a verdade.
Depois disso eu cheguei à conclusão de que não dava mais para assistir minha profissão ser desvalorizada sem fazer nada. Precisava fazer algo e eis que finalmente, depois de anos de atraso, tiro do papel meu blog sobre História. Eu não posso mais acompanhar dia após dia meu trabalho ser desvalorizado e menosprezado por quem sequer abriu um livro didático de história na escola.
Reconheço que vivo um embate interno, pois sei que a falta de informação e de estudo de uma parte da população é em decorrência dessa desvalorização (proposital) da Educação, por parte das autoridades públicas. Não tenho dúvidas disso. Por esse motivo, não posso cobrar de quem vende o almoço pra comprar a janta uma reflexão crítica sobre tudo o que consome nas redes sociais. Não posso culpá-los por contribuir para a desvalorização do meu trabalho. Mas posso oferecer um espaço de fácil acesso para compartilhar o que eu aprendi e ainda estou aprendendo, até porque o aprendizado é um processo contínuo, isto é, sempre se pode aprender um pouco mais.
O blog terá essa característica, um espaço para compartilhar saberes construídos através da pesquisa Histórica. Metodologicamente guiada pelos padrões científicos que a área exige. Porém, a linguagem apresentada será a menos acadêmica possível, dado que meu objetivo é alcançar a todos. A princípio tentarei postar aqui uma vez por semana, em vista dos meus compromissos profissionais e estudantis. Aos poucos o espaço tomará forma e será composto por textos de temas diversos que envolvam História, Sociologia, Filosofia, Política e Educação. Comprometo-me a realizar a moderação dos comentários para que sejam publicados aqui contribuições pertinentes. Críticas serão sempre bem-vindas, xingamentos não.
O Mas que História é essa? não nasce das cinzas do Museu Nacional, mas sim do meu basta a tanto descaso com a educação e a pesquisa neste país, proferido por todos aqueles que nos desqualificam em todos os espaços, seja nas redes sociais, seja nas cúpulas de governo. A forma que eu encontrei de ser subversiva é estudando. O maior ato de rebeldia que a classe trabalhadora pode realizar é ocupar os espaços culturais e educativos para aprender a lutar. E eu irei ajudá-los nesse caminho.

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